Caros – você já devem ter lido neste blog alguns comentários pouco elogiosos que faço a certos “analistas” que mudam de idéia (e projeções) como mudam de roupa. Pois bem, eu não sou analista mas também sou obrigado a fazer algumas projeções para a minha matriz, na França.
Somos uma seguradora de crédito, com necessidades específicas de entendimento. Não precisamos acertar “a asa direita do mosca verde”, como acontece com o pessoal que opera com bolsa e futuros.
Enfim como não há nada de excepcional nas nossas projeções, assim como não há nada que meus concorrentes possam ler aqui que eu não falaria para eles durante um almoço, resolvi dividi-las com vocês.
Talvez sirva como curiosidade, em especial pela forma pouco “ortodoxa” que eu as comunico. Projeções deste tipo, em momentos como estes que vivemos, não podem ser levadas “tão a sério” e tem muito “analista” que se leva muito a sério…
Abaixo a tradução do que mandei para Paris, nesta última 6af.
1. Estado Geral da Economia:
Estimamos um crescimento próximo de zero, não nos surpreendendo se for levemente negativo. No Brasil, não temos propriamente uma crise macroeconômica clássica, haja visto que os fundamentos gerais da economia estão bem.
Temos sim uma sucessão de crises microeconômicas, geradas por duas causas principais:
- Redução do comércio internacional, com consequente queda nas exportações (em volume e preço).
- Redução da oferta de crédito: (a) internacional, que afeta o financiamento do comércio exterior brasileiro e grandes projetos em andamento, (b) doméstico, por conta da redução do apetite de risco dos bancos que operam no Brasil, que afeta o capital de giro das empresas.
2. Setores Impactados
Diferentente de muito países, os bancos brasileiros mostram-se saudáveis e reduziram sua exposição a risco justamente pelo perfil conservador que sempre tiveram. No momento, os setores mais afetados parecem ser:
- Setores exportadores com dificuldade para redirecionar sua produção para o mercado interno (e.g. mineração, aço)
- Construção civi e sua cadeia
- Bens de capital, máquinas e equipamentos
- Bens de consumo durável, de alto valor agregado e demandador de financiamento
- Certos setores do varejo que estavam estocados em excesso no Natal e agora encontram dificuldade para rolar suas dívidas.
3. Inadimplência
Tanto os sinistros de crédito declarados à Coface, como os indicadores divulgados pela SERASA e outras entidades, demonstram uma aceleração da inadimplência. Na nossa visão, esta ainda vai piorar nos próximos 2 trimestres, antes de vermos uma reversão deste quadro.
4. Variáveis Macroeconômicas
- Câmbio: é baixo o risco de uma nova maxidesvalorização do real frente ao dólar. O pior já passou. Atualmente, a taxa anda ao redor dos R$ 2,25 e poderá flutuar até R$ 2,50, salvo se uma nova hecatombe de más notícias surgir.
- Juros: a tendência dos juros básicos (SELIC) é de baixa, podendo atingir 10% ao final deste ano (não acredito em menos do que isso em 2009). Mais complexa é a análise dos juros cobrados pelos bancos, pois aí dependemos do apetite de risco destes. A tendência é de queda, porém mais lentamente do que a queda da SELIC.
- Crédito: continua restrito para empresas e famílias que não demonstram com transparência sua situação financeira e formas de repagamento do empréstimo. Mas já notamos um pequeno movimento de distensão, ainda que seja na direção de empréstar mais para os agentes que precisam menos (“flight-to-quality”).
- Déficit e Dívida Pública: o país vem mantendo suas contas em constante superavit primário, mas este quadro tende a se modificar, agora que a arrecadação caiu. De qualquer forma, o Brasil nunca enfrentou maiores problemas para financiar sua dívida interna, em reais, até porque faltam outras opções de aplicação para os investidors domésticos.
É isso. Obrigado + abraços,
Fernando
PS: esta minha visão, por mais honesta que seja, tem tanta chance de estar errada como qualquer outra. Portanto, fiel seguidor de Blog, não se anime a sair tomando decisões de vida por conta destas projeções.